Seu
Joaquim era o dono da pastelaria, a única por perto. O dia estava sendo
lucrativo para ele, uma fila quilométrica e desordenada, onde não se sabia
distinguir começo e fim, formava-se em frente ao estabelecimento.
- Ui!,
gemia de quando em quando uma senhora ao ter um dos pés pisado e, logo em
seguida, disparava mais xingamentos por minuto do que uma metralhadora dispara
tiros.
Às 16:15,
já se ouviam reclamações. O trem havia atrasado. Um vendedor de amendoim,
aproveitando-se da situação, enfiou-se no meio da multidão e começou a berrar:
-
Amendoim! Ó o amendoim! É só cinquenta centavo!
E as vendas alavancaram. Os famintos sem
dinheiro o suficiente para o pastel ou sem disposição para encarar a fila, logo
foram ao encontro da voz que anunciava o aperitivo barato. Transcorrido o tempo
exato de cinco minutos, o trem chegava à estação, com os assentos já ocupados.
A multidão precipitou-se para dentro do veículo, onde todos ficaram espremidos.
Entretanto, nem todo mundo conseguiu
entrar, pois a lotação máxima já havia sido ultrapassada. Muitos dos que
ficaram para trás estavam na fila do pastel. Não havia remédio a não ser
esperar o próximo trem. Aos que conseguiram embarcar apenas restava aproveitar
a cômoda viagem até a estação em que desceriam.
No interior do trem, havia uma luta pela
sobrevivência. Como o ar era escasso, respirar tornava-se uma tarefa difícil.
Quem não estivesse perto das janelas teria de se contentar com o cheiro de
suor, que descia pelo rosto colando a fronte dos cabelos na testa.
A viagem não era longa, mas num ambiente
como aquele parecia uma eternidade. A beleza das paisagens pelas quais o
comboio passava pouco era notada pelos passageiros, estressados com a viagem e
preocupados com o orçamento familiar. Comeriam arroz com feijão naquele mês? Um
dos dois faltaria? Perguntas e mais perguntas. Insegurança e desassossego.
Muitas velhas rezavam todos os dias, manhã, tarde e noite, e nada se alterava.
Teria deus esquecido daquelas pessoas?, perguntavam-se sem resposta. Porém,
onde há sofrimento, há fé, onde há fé, há esperança e onde há esperança
desistir não é uma opção. E assim caminha essa gente, de olhos vendados, sem
saber se a estrada que trilham é segura, apenas à espera de uma melhoria no
futuro. Futuro esse que talvez não altere em nada a dura realidade em que
vivem. Mas a esperança prevalece.
Renan Almeida, maio de 2012.