segunda-feira, 14 de maio de 2012

Historinha da estação de trem

            De tarde, na Avenida S. José do Rego, fazia um calor infernal. Na plataforma, aguardando o trem das quatro horas, trabalhadores suados amontoavam-se num festival de odores. Os que possuíam ainda alguns trocados gastavam com o pastel de palmito frito a óleo de dois dias. Os restos de comida serviam de alimento aos camundongos, que ora circulavam livremente, ora optavam por se esconder.
Seu Joaquim era o dono da pastelaria, a única por perto. O dia estava sendo lucrativo para ele, uma fila quilométrica e desordenada, onde não se sabia distinguir começo e fim, formava-se em frente ao estabelecimento.

- Ui!, gemia de quando em quando uma senhora ao ter um dos pés pisado e, logo em seguida, disparava mais xingamentos por minuto do que uma metralhadora dispara tiros.

Às 16:15, já se ouviam reclamações. O trem havia atrasado. Um vendedor de amendoim, aproveitando-se da situação, enfiou-se no meio da multidão e começou a berrar:

- Amendoim! Ó o amendoim! É só cinquenta centavo!

         E as vendas alavancaram. Os famintos sem dinheiro o suficiente para o pastel ou sem disposição para encarar a fila, logo foram ao encontro da voz que anunciava o aperitivo barato. Transcorrido o tempo exato de cinco minutos, o trem chegava à estação, com os assentos já ocupados. A multidão precipitou-se para dentro do veículo, onde todos ficaram espremidos.

         Entretanto, nem todo mundo conseguiu entrar, pois a lotação máxima já havia sido ultrapassada. Muitos dos que ficaram para trás estavam na fila do pastel. Não havia remédio a não ser esperar o próximo trem. Aos que conseguiram embarcar apenas restava aproveitar a cômoda viagem até a estação em que desceriam.

         No interior do trem, havia uma luta pela sobrevivência. Como o ar era escasso, respirar tornava-se uma tarefa difícil. Quem não estivesse perto das janelas teria de se contentar com o cheiro de suor, que descia pelo rosto colando a fronte dos cabelos na testa.

         A viagem não era longa, mas num ambiente como aquele parecia uma eternidade. A beleza das paisagens pelas quais o comboio passava pouco era notada pelos passageiros, estressados com a viagem e preocupados com o orçamento familiar. Comeriam arroz com feijão naquele mês? Um dos dois faltaria? Perguntas e mais perguntas. Insegurança e desassossego. Muitas velhas rezavam todos os dias, manhã, tarde e noite, e nada se alterava. Teria deus esquecido daquelas pessoas?, perguntavam-se sem resposta. Porém, onde há sofrimento, há fé, onde há fé, há esperança e onde há esperança desistir não é uma opção. E assim caminha essa gente, de olhos vendados, sem saber se a estrada que trilham é segura, apenas à espera de uma melhoria no futuro. Futuro esse que talvez não altere em nada a dura realidade em que vivem. Mas a esperança prevalece.


Renan Almeida, maio de 2012.

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